terça-feira, 17 de março de 2015

Encontro em Contos - Parte III

Ela não podia acreditar no que ouvia. Era aquela voz forte e grossa a mesma que disse: “Gata, você tem que olhar por onde anda”. Ela sabia quem era, e lembrava muito bem ainda no corpo a sensação que aquela voz lhe provocava.

-Quem é?
-O cara que ainda está com cheiro de vinho, não consegui tirar de mim o aroma daquele esbarrão.
Foi impossível não se sentir molhada naquele momento. Novamente.
-Não é um pouco tarde? Disse ela, se enroscando na cama, como se ele a pudesse ver em um ensaio sensual.
-Gata, nunca é tarde, tudo depende da motivação.
-Sim, depende, mas são duas da manhã e eu tenho um dia bem agitado amanhã. Se for sobre o note não se preocupe, foi um acidente e você não teve nenhuma culpa. Eu fico meio desastrada mesmo, com a cabeça na lua quando estou escrevendo.
-Toma um vinho comigo, podemos conversar e chegar a um acordo sobre a culpa ser de quem no episódio. Me sinto mal pelo seu computador. Garanto que não haverá arrependimentos.

Aquela frase soou bastante erótica, e as ondas de prazer ainda estavam pelo seu corpo - não haverá arrependimentos - ele tem namorada, isso é um problema. Ou um dilema, mas o desejo foi mais forte do que o bom senso.

- Onde? Não posso demorar muito, amanhã tenho algumas coisas a fazer e realmente preciso do meu note para sexta-feira. Aqui na esquina tem um barzinho, te encontro em 20 minutos. Anota o endereço, disse já sentada e suficientemente excitada para pensar no encontro que estava por vir.E em nada parecia com alguém que estava dormindo há 10 segundos atras.

Enquanto passava o endereço do bar pensou na frase ao telefone “A namorada foi para casa”, seria isso um convite? Uma promessa? Não sabia como lidar com todo aquele tesão que lhe invadia o corpo, de onde havia saído tanto desejo. Sim, era uma mulher cheia de tesão, e tinha uma vida sexualmente ativa mas aquele homem despertava algo diferente nela. Era desejo, curiosidade, expectativas.

Vinte minutos depois ela avistava aquele cara cheio de estilo que atraía a atenção de todos, homens e mulheres. Agora estava de calça branca e uma camiseta azul. O bar era escuro e com apenas 4 mesas. Havia um atendente e um garçom, a rua já estava vazia e apenas a dele e mais uma mesa estavam ocupadas. Estava sentado com uma taça de vinho e o seu olhar era fuzilante, não conseguia disfarçar o embaraço enquanto caminhava até a mesa, pensando se cumprimentaria, ou apenas sentaria à mesa. Séria ou sorridente? Não teve tempo.

-Olá gata, pontual, bom começo, disse ele claramente com os olhos fixos em seu decote.

Sabia que deveria ter escolhido um vestido menos decotado. Afinal, o assunto era o note, ou deveria ser. Porque sempre escolhia os vestidos decotados demais? Era uma sina sua, ao escolher achava perfeito, mas quando o primeiro olhar masculino desejava observá-los mais atentamente se arrependia. A distração com o pensamento do decote lhe deu tempo para assentar-se e acenar ao garçom enquanto respondia.

-Não costumo me atrasar. Gosto de ser pontual e cumprir com minhas promessas, disse mostrando ao garçom o vinho que desejava beber.
-Que bom, também cumpro as minhas. Onde está o computador? Quero devolvê-lo a você consertado o mais rápido possível.

Ficou muda, não era bem o que esperava ouvir, mas o que afinal ela esperava ouvir? Vim até aqui para transar com você. Aquele pensamento estava explícito em seu corpo, não conseguia disfarçar o desejo. Talvez nem quisesse.

-Não o trouxe, deixei em casa. Na verdade não há necessidade alguma de conserta-lo, o que ocorreu foi um acidente queria apenas pedir desculpas pelo meu comportamento, não costumo ser assim. Fui extremamente deselegante com você e com sua namorada. O que aconteceu foi um acidente e não há culpados, disse dando graças a Deus por sua rapidez de raciocínio. Bela desculpa, pensou.
-Não aceito essa situação, preciso que você me deixe consertá-lo. A culpa foi minha, não sou do tipo que aceita culpas com facilidade mas nesse caso, quero consertar seu computador. Vamos busca-lo na sua casa, disse sem rodeios.

Ao chegarem ao apartamento, depois de algumas taças de vinho e as negativas dela em entregar o notebook para o conserto e insistência dele, seguidos de uma caminhada até o apartamento dela e já eram quase 5 da manhã. Ela não percebeu o tempo passar, e a lembrança da namorada lhe tomou de assalto. Talvez fosse o vinho. Resolveu perguntar, enquanto abria a fechadura da porta

-Sua namorada não se ressente de não estar com você em uma noite de sexta? Ou melhor, pelo fato de estar com outra mulher numa noite de sexta?
-Não.
-Vocês tem um relacionamento aberto? Ela não se incomoda mesmo? Afinal, você está na casa de uma mulher gostosa, linda, solteira e que já tomou algumas taças de vinho, disse sugestiva embora por dentro recriminava-se por cada palavra.
-Não. Onde está o computador? disse em tom seco e quase impaciente.
-Você não quer falar sobre ela? Algo te incomoda?

Sem que ela pudesse perceber qualquer movimentação foi tomada por um beijo quente, molhado. Suas mãos estavam em sua cintura e nuca e a única coisa que ela podia pensar era que sua boca era melhor do que a sua imaginação poderia prever. O beijo era incrível, e ela queria mais, seu corpo pedia mais. A porta se fechou sem muita força e logo ele estava em cima dela, a encostando na parede, seu corpo salientava o desejo e ela se rendia. Mas ele se afastou. E disse olhando fundo em seu decote e depois encontrando seus olhos:

-Ela não é minha namorada, é minha irmã. Uma brincadeira que fazemos sempre que saímos juntos. Evita que as noites acabem como essa. Sem ela. Mas com você não funcionou, estou aqui e quero transar com você. Não há nada que me impeça e mesmo se tivesse não sei se resistiria a esses peitos maravilhosos. É esse desejo que me traz aqui. Teria dito antes mas você não calava a boca, só quero agora arrancar sua roupa e transar com você. Posso?

Ele disse aquilo tudo em um só fôlego passeando com uma mão por dentro do vestido, acariciando a sua bunda e a outra descendo o zíper do vestido.

-Pode.

Consentimentos dados, os dois eram adultos,o alívio pelo fato de não estar traindo ninguém. O sexo foi intenso, forte,atrevido até os primeiros raios da manhã. Quando o sol ameaçava entrar pela janela, sentiu a exaustão tomar conta do seu corpo e dormiu, ali, nua. O cheiro dele estava por todo o ambiente e o desejo havia cedido lugar à calmaria.

Os olhos se abriram, o sol estava alto no céu e o calor era insuportável, uma pequena pontada na cabeça sinalizava o vinho da noite anterior. O suor pedia um banho, a noite veio à mente de súbito e o cheiro dele ainda pairava no ar. Mas ele não. Levantou-se de um pulo quase em fúria. A fúria durou um segundo, sobre a mesa de cabeceira um bilhete e uma maria sem-vergonha, dessas florzinhas que se acha em qualquer esquina.  No bilhete a seguinte frase:

Levei seu computador. Eu disse que te entregaria hoje no fim do dia. No fim do dia ele estará em suas mãos. A noite foi quente, quando acordar tome banho, ouse pensar em mim e a noite repetiremos tudo.

Um rubor lhe subiu misturado a um desejo incontrolável de repetir de uma vez aquela noite, que lhe voltava em flashes. Depois do banho e de um belo café da manhã ainda que ao meio dia, foi à praia. Não abria mão de ir à praia todo sábado à tarde. Havia decidido morar naquela cidade pela praia, pela energia capaz de ser renovada a cada mergulho. Encontrou-se com os amigos de sempre, riram e conversaram, mas a imagem dele não saía de sua lembrança. Como em arrepios as lembranças de seu corpo voltavam a cada par de minutos. Quando havia se distraído com uma conversa mais animada sobre uma nova banda, sentiu a bolsa vibrar, era o celular. O coração disparado.

-Oi Lili, é você - disse desanimada- estou na praia. Hoje não deu para almoçarmos juntas, mas chego para o café.

Lógico que era ela. Almoçavam juntas sempre no fim da manhã de sábado, depois da feira. Amiga de faculdade, haviam chegado juntas à cidade três anos atrás. As duas cheias de planos. O novo emprego, depois do estágio, iam trabalhar no mesmo andar. Foi sua primeira colega de quarto, antes da chegada da Bia, antes do casamento dela com o Pedro. Lili era a família que lhe restou depois do acidente  com os pais. Cursaram a faculdade juntas e tinham um vínculo especial. Depois da saída da empresa, prometeram se ver sempre, semanalmente, religiosamente. As rotinas eram muito pesadas e a os horários difíceis. Era uma promessa. Queria muito ver Lili hoje e contar tudo sobre o cara da noite anterior.

- Nunca transei assim, esse cara tem uma coisa diferente.
-Conta tudo! Como foi? Usou camisinha? Você estava precisando disso, obcecada com esse livro que eu nunca li nenhuma página, disse abraçando ela com força.
-Já te disse que não mostro nada, o que escrevo é somente para mim. E o livro já está pronto. Escrevi a última frase ontem. E sim , usei camisinha.
-E onde está? Ei, onde esta seu laptop? Aquilo é parte de você sempre que te encontro.
-Foi por causa dele que tudo começou, quer ouvir? Senta que agora vou falar de sexo e livros.
-Isso pede mais do que café pede bolo de chocolate.

Conversaram horas, ela contou todos os detalhes. As horas passaram sem que ela percebesse. Quando despediram-se era noite. Voltou pelo caminho, imaginando que ele estaria na sua porta, ou um bilhete a aguardasse. Chegou em casa e nenhum sinal dele, nenhum telefonema, nenhum bilhete. Nada. O medo de ter sido apenas uma noite foi maior do que o desespero de ter perdido seu note. Tudo estava salvo não perderia nada. Mas o que lhe preocupava era não mais vê-lo. Logo ela que sempre fugiu de relacionamentos, que nunca se preocupou com o dia seguinte. Sua cabeça ficou fixa em decifrar o que havia lhe atraido nele.No meio desse pensamento o celular.

-Oi gata, teve um bom sábado?
-Sim e você? Preferi a madrugada mas o sábado foi bom também.
-Quer repetir?
-Claro.
-Em breve. O seu computador está na recepção acabei de deixá-lo com o porteiro. Te vejo mais tarde, tenho que desligar. Ainda tenho muitas coisas para fazer hoje.
- Tudo bem, respondeu sem entender muito bem o que acontecia. Mas era daquelas que pouco perguntam, daquelas que em um relacionamento criam poucos problemas porque fazem poucas perguntas. A não ser na noite anterior, aquela enxurrada de perguntas, gerou uma transa incrível.
-Escreva, não quero te atrapalhar, apesar de estar cheio de tesão. E ainda ter o seu cheiro nas minhas mãos.
-Eu não escrevo no sábado.
-O que faz no sábado à noite?
-Saio, quase sempre com a Bia e o Pedro, meus amigos, a gente bebe depois sai para dançar. Na boate do hotel.
-Se importa se eu te encontrar lá?
-Não.
-Então a gente se vê lá, gata.

Aquele diálogo era bom, ele estava vivo e querendo mais, assim como ela, mas a deixava intrigada. O que era aquilo? O que acabaram de marcar? Sair junto com os amigos, ter de apresentar o cara para a Bia e o Pedro. Por que mencionou os dois? O que estava de errado naquilo tudo? E por que não havia corrido para buscar o note? A vida organizada estava se desorganizando? Buscou o note e checou suas pastas organizadas e prontas. O trabalho de três anos. Sentiu-se feliz e realizada.

Já passava das dez da noite, se arrumou, não da mesma forma que se arrumou no dia anterior. Estava ainda mais quente. A maquiagem mais forte e o vestido mais decotado. Os cabelos presos em um coque, deixava cair alguns fios pelo rosto, batom vermelho, brincos, sapato alto e muita disposição. A noite era sua, o sábado era seu. Procurou se desvincilhar dele, da lembrança dele, mas o cheiro no ar e a cama bagunçada marcavam em sua memória o encontro da noite anterior. Estava pronta.

A boate estava cheia mas isso nunca foi um problema, nunca pegava fila por ali. Os amigos eram amigos de amigos, coisas da noite. Dançava como se fosse aquela a última, quando sentiu o perfume e em sua nuca a barba que tanto lhe fazia pensar o dia todo. Sentiu as mãos no decote e em rodopio estava dentro da boca dele, que escorregou as mãos até sua bunda e em um tapa certeiro, a virou dizendo: - Estou te observando desde de que chegou.

Quero comer você aqui.


Continua na terça-feira que vem! :)

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